Pular para o conteúdo

Ozonioterapia

A Medicina Integrativa (MI) classifica a Ozonioterapia como uma Terapia Não Convencional (TNC), de caráter experimental, indicada segundo o diagnóstico nosológico médico específico, dentro de um protocolo técnico e científico que viabilize a aplicação da técnica com as margens de seguranças clínicas previstas.

De acordo com a resolução do CFM nº 2.181/2018, a Ozonioterapia é considerada como procedimento experimental para a prática médica e, de acordo com as fundamentações contidas no anexo desta resolução, só pode ser realizada sob protocolos clínicos, de acordo com as normas do sistema CEP/Conep, em instituições devidamente credenciadas.

A Medicina Integrativa não ignora a existência desta TNC, mas entende que a utilização sem o caráter descrito acima, por profissionais de saúde que inadequadamente fizerem uso terapêutico de forma aleatória, está sem o amparo técnico, podendo infringir o Código de Ética Médica.

A Inserção da Ozonioterapia na Medicina Integrativa

A Ozonioterapia é uma Terapia Não Convencional (TNC) que integra a MI, sendo de caráter experimental o procedimento no Brasil por resolução do CFM.

A Sociedade Brasileira de Medicina Integrativa (SBMI) ratifica a importância de estudos acadêmicos-científicos que avaliem, desde suas características físico-químicas e as propriedades do gás ozônio, assim como seus equipamentos de produção, armazenamento e aplicação, de acordo com as normas previstas em lei. A partir do maior esclarecimento sobre o tema, com o sequenciamento das pesquisas na área aplicada em saúde, a prática será melhor aceita pela comunidade médico-científica.

Não existe terapia, seja ela convencional, tradicional, não convencionais ou práticas complementares de bem-estar que seja inócua ao paciente. O diagnóstico nosológico médico garante uma boa prescrição do plano terapêutico e a integração das terapias propostas.

A SBMI entende que para agregar terapias se fazem necessários a formação técnica e o conhecimento adequado para o discernimento da indicação, aplicação e encaminhamentos para as TNCs. Dessa forma, são evitados possíveis agravamentos clínicos, riscos físicos e psíquicos do uso inadequado das técnicas terapêuticas.

Integração Médica com a Ozonioterapia

No século XIX, foi descoberto o gás ozônio pelo pesquisador Christian Friedrich Schoenbein, que o nomeou desta forma devido ao “cheiro elétrico” característico envolvido no seu processo de criação artificial (Bocci et al., 2009). Nesta época, foram identificadas ações bactericidas do ozônio, tendo sido utilizado durante a Primeira Guerra Mundial para tratar soldados alemães afetados por gangrena gasosa devido a infecções anaeróbicas por Clostridium SSP (Bocci et al., 2009). A Ozonioterapia começou a ser utilizada na Alemanha e na União Soviética na primeira guerra mundial, se difundindo como técnica terapêutica pela Europa, China e América (Anzolin, Bertol, 2018).

Na Ozonioterapia, é utilizada uma mistura gasosa de cerca de 95% de oxigênio e não mais que 5% de ozônio (Anzolin, Bertol, 2018). Aventa-se que o ozônio desencadeia uma série de mecanismos que levam à normalização da oferta de oxigênio, podendo corrigir doenças ligadas à isquemia, infecções, retardo na cicatrização e estresse oxidativo (Anzolin, Bertol, 2018). Pode ser utilizado na forma tópica, infiltrativa ou sistêmica (Hidalgo-Tallón et al., 2020). As aplicações tópicas aproveitam o poder germicida do ozônio e seu efeito em processos de cicatrização (Hidalgo-Tallón et al., 2020). O ozônio infiltrado em concentrações entre 4 e 30 µg/ml é útil para o tratamento de doenças musculoesqueléticas, como artrite, tendinite, miosite, fascite, neurite ou dor miofascial. A ozonioterapia sistêmica consiste na administração da mistura de gases por via intravenosa indireta (também conhecida como auto-hemoterapia) e a insuflação retal (Hidalgo-Tallón et al., 2020).

Com base nos mecanismos de ação, a terapia de ozônio pode induzir as seguintes respostas biológicas: melhora a circulação sanguínea e aumento da oferta de oxigênio ao tecido isquêmico, modulação enzimática da cadeia antioxidante celular, indução da ativação do sistema imunológico e aumento da liberação de fatores de crescimento; ação desinfectante quando utilizada topicamente, estímulo do sistema neuro-endócrino. Assim, a Ozonioterapia atuaria sistemicamente como um modificador de resposta biológica (Bocci et al., 2009).  Vários autores publicaram estudos pré-clínicos sobre os efeitos do ozônio medicinal em organismos vivos, sendo capazes de demonstrar efeitos benéficos na capacidade de modular o equilíbrio redox, o estado de inflamação celular e a adaptação ao processo de isquemia/reperfusão (Hidalgo-Tallón et al., 2020).

Já foram descritas utilizações terapêuticas em várias patologias, como osteomielites, abscessos, úlceras de decúbito, pé diabético, queimaduras, doenças isquêmicas, degeneração macular relacionada com a idade (forma atrófica), problemas ortopédicos, fibromialgias, tratamento de cáries dentárias, osteonecrose da mandíbula, infecções agudas e crônicas da cavidade oral, hepatites, herpesvírus, papilomavírus, herpezoster, onicomicose, criptosporidiose, fadiga em pacientes com câncer, doenças auto-imunes (artrites reumatóides, doença de Crohn, psoríases, esclerose múltipla), doença pulmonares, síndrome do estresse respiratório agudo, sepses e disfunção de vários órgãos, hérnia de disco lombar, osteoartrite do joelho, isquemia-reperfusão tecidual após revascularização, acidente vascular cerebral e câncer (Bocci et al., 2005; Hao, 2019). As aplicações clínicas frequentes referem-se a uma série de utilizações em sistema cardiovascular, patologias cutâneas e subcutâneas, disfunções neurológicas, ortopédicas, gastrointestinais, mandibulares, geritounirárias e de cabeça e pescoço (Smith et al., 2017).

Na assistência odontológica, as aplicações são diversas, em protocolos variados e patologias diversas, como periodontite, gengivite, efeitos anti-inflamatórios e antimicrobianos em processos pré e pós cirúrgicos, profilaxia dental, entre outros (Tricarico et al., 2020). A terapia com ozônio é o método de tratamento minimamente invasivo, sem desconforto ou dor, reduzindo a ansiedade e o nível de estresse do paciente, pois reduz a duração do tratamento (Sen, Sen, 2020).

O Ministério da Saúde implementou a Ozonioterapia como uma Prática Integrativa no Sistema Único de Saúde (SUS) através da Política de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PNPICs).

No entanto, o Conselho Federal de Medicina (CFM) não reconhece essa técnica terapêutica na prática médica. De acordo com a Resolução CFM nº 2.181/2018, essa prática só pode ser realizada sob protocolos clínicos de acordo com as normas do sistema CEP/CONEP, em instituições devidamente credenciadas, com linhas de pesquisas previamente definidas. O Conselho Nacional de Ética e Pesquisa considera a Ozonioterapia como procedimento experimental para a prática médica (de Andrade et al., 2019).

Em função dos resultados conflitantes em estudos clínicos, e, da posse dos efeitos tóxicos já reportados (Bocci et al., 2009), existem ressalvas sobre essa terapia não convencional e o risco de suas práticas invasivas / intervencionistas, devido à falta de segurança e eficácia ainda comprovada nos tratamentos propostos até o momento.

Países como Rússia, Grécia, Itália, Alemanha, China, Espanha, Turquia, Portugal, México e Ucrânia utilizam esta terapia não convencional (ISCO#, 2020). Apenas na Rússia, Cuba, Espanha e Itália a técnica é legalizada (Anzolin, Bertol, 2018).

No Brasil, a prática foi iniciada no país em 1975 pelo médico Heinz Konrad, sendo divulgada por outro médico, o Dr. Edison de Cesar Phillippi. A Associação Brasileira de Ozonioterapia (ABOZ) tornou-se a referência sobre esta temática terapêutica e vem buscando criticidade para que essa técnica seja reconhecida.

A USP – Universidade de São Paulo – apresenta pesquisas na área, em aplicações terapêuticas odontológicas (Ferreira et al., 2014) e veterinárias (Lage-Marques, 2009).

Em 2012, o médico e Prof. Dr. José Oswaldo de Oliveira Junior, época em que fazia parte da Escola de Cancerologia Celestino Bourroul da Fundação Antonio Prudente (FAP) de São Paulo publicou uma revisão de literatura sobre os resultados favoráveis da ozonioterapia em dor lombar sem ou com ciatalgia. Afirmou que, embora somente liberada para uso apenas em pesquisa científica, pacientes portadores de dores lombares axiais, com ou sem comprometimento apendicular radicular ou referido, na ausência de deficiências neurológicas, podem ser beneficiados com este método (de Oliveira Junior, Lages, 2012). Em 2019, foi publicada revisão sistemática com resultados favoráveis para tratamento de dor lombar após tratamento por seis meses (de Andrade et al., 2019).

Na Universidade de Brasília, a técnica foi estudada em uso odontológico para tratamento de disfunção temporomandibular, no qual verificou-se que o grupo experimental obteve resultados positivos estatisticamente significantes superiores ao grupo controle, demonstrando ser uma forma de tratamento promissora (Rota, 2019).

Em 2021, Pires pode demonstrar em tese de mestrado defendida na Universidade Anhembi Morumbi que o tratamento de pacientes com cistite intersticial/síndrome da bexiga dolorosa apresentou interferência direta nos mecanismos etiológicos associados a IC/BPS, com melhora de parâmetros clínicos e de funcionalidade vesical com baixo custo e ausência de efeitos colaterais (Pires, 2021).

Nos Estados Unidos, os regulamentos atuais da Food and Drug Administration (FDA) não restringem o uso em situações em que segurança e eficácia da utilização de Ozonioterapia foram comprovadas.

No exterior, além de associações de profissionais de saúde (como a Associação Espanhola de Ozonoterapia – SEOT ou a Federação Mundial de Ozonoterapia – WFOT), que tentam unificar critérios e desenvolver protocolos de tratamento, bem como formar profissionais de saúde no uso do ozônio, a Universidade Católica de Múrcia tomou a iniciativa de criar uma cátedra de Ozonoterapia e Dor Crônica para melhor promover a formação e a pesquisa dentro da rede de universidades espanholas, sendo seu principal pesquisador o Prof. Dr. Francisco Javier Hidalgo Tallón (Hidalgo-Tallón et al., 2020).

Em Portugal e na Grécia, a ozonioterapia tem regulamentação específica e é utilizada em centros públicos e privados. No resto da União Europeia, há reconhecimento legal de utilização de geradores de ozônio médico. Em 2011, o Ministério da Saúde espanhol incluiu a ozonoterapia no portfólio de serviços das unidades para manejo de dor (Hidalgo-Tallón et al., 2020).

Vários manuais reúnem a experiência e o trabalho científico realizado até hoje por diferentes grupos de pesquisa, principalmente italianos, alemães, russos e cubanos (Hidalgo-Tallón et al., 2020). Destacam-se as pesquisas desenvolvidas nos países México (National Medical Center 20 de Noviembre), Cuba (com 25 anos de experiência, tendo pelo menos uma unidade de terapia de ozônio por província do país), Itália, neste último, se destacando as pesquisas do neurocirurgião Dr. Alberto Alexandre no Instituto Neurocirúrgico, Treviso, e do farmacêutico Prof. Dr. Velio Bocci, do Departmento de Biotecnologia, Química e Farmácia, Università degli Studi de Siena.

Estudos publicados têm demonstrado segurança e eficácia em estudos multicêntricos e, como perspectiva futura para comprovação da técnica, são necessários mais ensaios clínicos duplo-cegos e randomizados com maior número de pacientes (Smith et al., 2017). O mesmo se verifica em Odontologia, onde a técnica apresenta uma gama diversificada de utilizações, com bons resultados, entretanto, em função de possíveis efeitos colaterais durante a aplicação intra-oral (risco de que o trato respiratório superior seja atingido) e número limitado de pacientes observados nos estudos, ainda existe uma limitação para comprovação dos efeitos benéficos do ozônio no tratamento de diferentes condições bucais e dentárias (Sen, Sen, 2020).

Referências:

  • Anzolin AP, Bertol CD. Ozone therapy as an integrating therapeutic in osteoartrosis treatment: a systematic review. BrJP. 1(2): 171-175, 2018.
  • Bocci V, Aldinucci L, Bianchi L. The use of hydrogen peroxide as a medical drug. Rivista Italiana di Ossigeno-ozonoterapia 4(1): 30-39, 2005.
  • Bocci, V, Borrelli E, Travagli V, Zanardi I. The ozone paradox: Ozone is a strong oxidant as well as a medical drug. Medicinal Research Reviews 29(4): 646–682, 2009.
  • de Andrade RR, de Oliveira-Neto OB, Barbosa LT, Santos IO, CFS, Barbosa FT. Efetividade da ozonioterapia comparada a outras terapias para dor lombar: revisão sistemática com metanálise de ensaios clínicos randomizados. Rev. Bras. Anestesiol.69 (5):493-501, 2019.
  • de Andrade, Ribeiro R, Barbosa LT, Santos IO, Sousa-Rodrigues CF, Barbosa FT. Effectiveness of ozone therapy compared to other therapies for low back pain: a systematic review with meta-analysis of randomized clinical trials. Revista Brasileira de Anestesiologia 69(5): 493-501, 2019.
  • de Oliveira Junior JO, Lages GV. Ozonioterapia em lombociatalgia. Rev Dor. 13(3):261-70, 2012.
  • Ferreira R, Sant’ana ACP, Rezende MLRD, Greghi SLA, Zangrando MSR, Damante CA. Ozonioterapia: uma visão crítica e atual sobre sua utilização em periodontia e implantodontia: revisão de literatura. Innovations Implant Journal: Biomaterials and Esthetics 9 (2/3): 35-39, 2014.
  • Hao K, Tang S, Xie H, Li X, He X. Application of ozone therapy in interventional medicine.Journal of Interventional Medicine 2(1): 8-11, 2019.
  • Hidalgo-Tallón FJ, Torres-Morera LM, Baeza-Noci J, Carrillo-Izquierdo MD, Pinto-Bonilla R. Updated Review on Ozone Therapy in Pain Medicine. Front Physiol. 23;13:840623, 2020.
  • ISCO3 (2020) Declaração de Madri sobre Ozonoterapia, 3 rd ed. Madrid. www.isco3.org. Comitê Científico Internacional de Ozonioterapia. Disponível em: < biosanas.com.br/uploads/outros/artigos_cientificos/158/f15f529733ceb0acac6aecd2eca4bbfa.pdf>. Acesso em: 07 nov 2021.
  • Lage-Marques M. Estudo da ozonioterapia como contribuição para a odontologia veterinária. 2008. 65 f. Tese (Mestrado – Programa de Pós-Graduação: Clínica Cirúrgica Veterinária) – Faculdade de   Medicina Veterinária e Zootecnia. Departamento de Cirurgia. Universidade de São Paulo. São Paulo, 2009.
  • Pires, MVA. Avaliação da resposta ao uso de gás ozônio intravesical na cistite intersticial/síndrome da dor na bexiga. 2021. 139 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Biomédica) – Universidade Anhembi Morumbi, 2021.
  • Rota AC. Avaliação e implementação de nova forma de tratamento para a Disfunção Temporomandibular. 2019. 94 f. Dissertação (Mestrado em Odontologia) – Universidade de Brasília, Brasília, 2019.
  • Sen S, Sen S. Ozone therapy a new vista in dentistry: integrated review. Med Gas Res. 10(4):189-192, 2020.
  • Smith NL, Wilson AL, Gandhi J, Vatsia S, Khan SA. Ozone therapy: An overview of pharmacodynamics, current research, and clinical utility. Med Gas Res 7:212-9, 2017.
  • Tricarico G, Rodrigues Orlandin J, Rocchetti V, Ambrosio CE, Travagli V. A critical evaluation of the use of ozone and its derivatives in dentistry. Eur Rev Med Pharmacol Sci. 24(17):9071-9093, 2020.
  •  Vanni, D, Galzio R, Kazakova A. et al. Terapia de ozônio intraforaminal e efeitos colaterais específicos: resultados preliminares e alerta precoce. Acta Neurochir 158, 491–496, 2016.