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Musicoterapia

A Medicina Integrativa (MI) classifica a Musicoterapia como uma Terapia Não Convencional (TNC), uma vez que esta técnica não está inserida na metodologia clássica dos programas terapêuticos e não referenciadas nos principais protocolos e guidelines. Isso não significa que essas condições diminuam o poder terapêutico dessa técnica quando utilizada segundo um diagnóstico nosológico médico e em conjunto com outras técnicas convencionais.

A Inserção da Musicoterapia na Medicina Integrativa

A música como terapia na Medicina Integrativa permite ao médico e aos demais profissionais de saúde a articulação indispensável para a indicação e encaminhamento para a Musicoterapia, classificada como TNC pela Sociedade Brasileira de Medicina Integrativa (SBMI). A integração dessa terapia, em conjunto com os tratamentos convencionais, proporciona, por meio dos elementos constituídos da música, uma interatividade cognitiva comportamental e cultural, facilitando a conscientização, a aderência e a corresponsabilidade do paciente ao tratamento.

A interdisciplinaridade que a MI promove junto às mais diversas terapias prezando o diagnóstico nosológico médico como fundamental referencia para a elaboração de um plano terapêutico, que envolva os profissionais de saúde e suas especialidades. Essa interface provocada pelo modelo integrativo oferece novas viabilidades assistenciais na atenção primária, secundária e na promoção de saúde com os dispositivos previstos nas legislações.

Integração Médica com a Musicoterapia

A Musicoterapia praticada atualmente é fruto do desenvolvimento de 30 mil anos de tradições xamânicas de música e cura. Muitas são as teorias que explicam as origens da música, mas historiadores apontam como principal objetivo a necessidade de comunicação de antepassados primitivos e que, na medida em que esses sons deixaram de ser suficientes para essa comunicação e expressão, eles sentiram necessidade de criar objetos sonoros que, pouco a pouco, transformaram-se nos instrumentos musicais (Barcelos, 2016). As primeiras civilizações estabeleceram-se, principalmente, nas regiões férteis ao longo das margens de importantes rios, como Mesopotâmia e Egito, sendo a iconografia dessas regiões rica em representações de instrumentos musicais e de práticas musicais (Barcelos, 2016).

No século XIX até a segunda metade do século XX, a Musicoterapia era uma terapêutica aplicada principalmente pelo médico, com a colaboração de músicos. Nesse período, o termo terapêutica musical deixou de ser aplicado, sendo substituído por Musicoterapia. A integração dos conhecimentos fisiológicos, terapêuticos, associados a ciência musicológica permitiu ainda no século XX a formação de Musicoterapeutas especialistas nessa técnica não convencional (Piazzetta, 2006).

Os primeiros estudos dos efeitos terapêuticos da música foram elaborados em 1944, em Michigan (EUA) e em 1950 foi fundada a Associação Nacional para Terapia Musical nos Estados Unidos. No Brasil, foi fundada em 1995 a União Brasileira das Associações de Musicoterapia – UBAM (Piazzetta, 2006).

A música possui uma concepção de “força terapêutica”, revelando uma importante capacidade de harmonização do corpo e mente, sendo capaz de produzir no sujeito um estado de completo bem-estar físico, mental e emocional (Austin, 2008). Constitui-se em um processo sistemático de intervenção em que o terapeuta ajuda o paciente a promover a saúde utilizando experiências musicais e as relações que se desenvolvem através delas como forças dinâmicas de mudança (Barcelos, 2016).

Através da Musicoterapia, as experiências musicais como audição, recriação, improvisação e composição de músicas/canções, através da voz, de instrumentos e do corpo são veículos para facilitar a comunicação, o estabelecimento do vínculo terapêutico, a auto-expressão e auxiliar na promoção/prevenção ou restauração da saúde de pessoas que padecem das mais variadas condições bio/psico/sociais/espirituais (Barcelos, 2016; Piazzetta, 2006). Fortifica-se na integração entre Arte, Saúde e Ciência, embasa-se em reflexões sobre o campo híbrido e/ou transdisciplinar, utilizando os elementos musicais como: som, ritmo, melodia e harmonia e com as suas técnicas de bases e evidências científicas. Atende as necessidades físicas, emocionais, mentais ou sociais, podendo ser aplicada de forma individualizada ou em grupo (Piazzetta, 2006; Chagas, Pedro, 2008).

Na Musicoterapia, a promoção, prevenção e a restauração da saúde em condições bio/psico/sociais/espirituais é obtida pelo conjunto de percepções e experiências musicais e culturais dos pacientes, através da “Empatia Cultural”. Ou seja, o objetivo é promover comunicação, o estabelecimento da relação terapêutica, a auto-expressão, compreendendo as relações de interação e subjetividade, possibilitando acolhimento, vínculo e autoexpressão (Barcellos, 2015). O som é percebido por uma série de estruturas cerebrais, que correlacionam a percepção auditiva do som e o reconhecimento de parâmetros característicos (altura, duração, timbre e intensidade) (Rocha, Boggio, 2013). Esta percepção primária do som e o seu entendimento sintático (entendimento da forma e a compreensão de organizações hierárquicas) são integrados em áreas corticais do cérebro com o sistema límbico (responsável pelas emoções), o que influencia emotivamente o processamento musical (Rocha, Boggio, 2013).

Existem pelo menos quatro níveis ou tipos de mecanismos responsáveis ​​pelo efeito da musicoterapia na terapêutica. O mais dominante e mais óbvio é a resposta cognitiva aprendida, em que a resposta emocional deriva do aprendizado prévio a um determinado som (Clements-Cortes, Bartel, 2018). Outra hipótese é mecanismo de circuitos neurais ativados por processos cognitivos, como movimento, fala e linguagem e memória, entre outros. Os níveis 3 e 4 são mais especulativos, baseando-se na teoria que essas respostas não são o produto do processamento cognitivo da música – elas são a resposta à música em um nível rítmico vibracional, em um mecanismo de resposta neural ou celular complexo (Clements-Cortes, Bartel, 2018). O nível 3 do modelo se concentra no mecanismo de coerência oscilatória neural, com neurônios disparando em sincronia. A estimulação rítmica dos sentidos (auditivo, visual, tátil) pode resultar em efeitos benéficos conforme a atividade neural que foi sensibilizada. O nível 4 propõe que existem mecanismos ativados pela música e pelo som no nível celular, variando conforme o tipo celular (Clements-Cortes, Bartel, 2018).

A utilização da técnica tem se mostrado proveitosa no tratamento de doenças psíquicas ou emocionais (Barcellos, 2015), como dificuldades de comunicação verbal e não verbal, sentimentos de baixa autoestima, impulsividade, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), depressão, autismo (AMTA, 2022) e esquizofrenia (Kamioka et al., 2014), entre outras questões psicoterapêuticas. Na área neurológica, é um tratamento promissor na Doença de Alzheimer, Parkinson e Esclerose Múltipla (Barcellos, 2015), dores de cabeça, traumatismo crânio-encefálico, problemas com movimento ou coordenação, reabilitação após uma lesão ou procedimento médico (AMTA, 2022) acidente vascular cerebral e distúrbios neurológicos (Raglio et al., 2015). Outras questões que podem ser manejadas com a Musicoterapia é a insônia (Wang et al., 2015), Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) (Bidabadi et al., 2015), transtornos por uso de substâncias e problemas respiratórios (AMTA, 2022).

Atualmente, no Brasil, a musicoterapia é uma prática em saúde integrativa, reconhecida pelo Ministério da Saúde e ofertada pelo Sistema Único de Saúde (SUS), presente nas Políticas Nacionais de Práticas Integrativas e Complementares de Saúde (PNPICs).

Algumas ações são conhecidas em serviços gratuitos de assistência à saúde, em Centro de Apoio Psicossocial (CAPS) ou hospitais públicos. Dentre alguns exemplos, cita-se o projeto Harmonia Enlouquece (banda de pacientes psiquiátricos do Centro Psiquiátrico do Rio de Janeiro), Cabecinha no ombro (em Belém do Pará) e o grupo Saracura (que atua em hospitais em São Paulo), dentre outros, que objetivam o bem-estar, o equilíbrio emocional e o cuidado humanizado em situações de doença (Donda, Leão, 2021).  Hospitais privados também oferecem centros de assistência com programas de Musicoterapia, como o Hospital Albert Einstein e Sírio Libanês em São Paulo, ou de forma multidisciplinar, durante a internação no hospital.

No Brasil, existem grupos de pesquisas sobre Musicoterapia, como Programa de Tratamento Musicoterapêutico do Grupo de Estudos da Dor da Divisão de Clínica Neurológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), coordenado pela Dra. Ana Maria Ferreira de Souza (Médica Assistente- especialista em musicoterapia pelo Conservatório Brasileiro de Música-RJ). No Hospital Albert Einstein, a Prof. Dra. Eliseth Leão do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein em São Paulo, difunde a técnica, tendo participado de alguns estudos com a temática tratamento e dor, principalmente.

Para obtenção do título de Musicoterapeuta, o profissional deve ingressar em curso superior de musicoterapia, com bacharelado de 4 anos, em média. O curso é ofertado em instituições públicas e privadas.

No país, se destacam na formação de musicoterapia pela Universidade Federal de Goiás (UFG), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), pelo Conservatório Brasileiro de Música (CBM-RJ) e a Faculdade de Artes do Paraná (FAP), sendo referência em linha de pesquisa sobre esta terapia. Em Joinville, o curso é ofertado pela Censupeg e em São Paulo, a FMU oferta o curso.

Profissionais da área da saúde também podem se formar como musicoterapeutas, desde que ingressem em curso de pós-graduação ou especialização na área. Tramita em lei a regulamentação da profissão no projeto de lei da Câmera nº 25 de 2005 (lei nº4.827/2001), incluindo atribuições, formas e finalidades para o músico ou para o profissional da área da educação e saúde.

A UBAM (União Brasileira das Associações de Musicoterapia) congrega e defende os interesses dos musicoterapeutas no Brasil. No exterior, existem associações com os mesmos propósitos, como a American Music Therapy Association, Australian Music Therapy Association, British Society for Music Therapy, Canadian Association for Music Therapy, Certification Board for Music Therapy, German Association for Music Therapy e National Coalition of Arts Therapies Association.

Referências: