Pular para o conteúdo

Constelação Familiar

A Medicina Integrativa (MI) classifica a Constelação Familiar como uma Técnica Não Convencional (TNC), que utiliza em suas bases metodológicas a psicoterapia breve, com uma abordagem sistêmica de elementos fenomenológicos familiares.

Técnica psicoterapêutica que vem sendo apurada pelo médico psiquiatra, Hector Fiorini, com a finalidade de investigar as inter-relações familiares nos seus mais diversos períodos existenciais.

A Inserção da Constelação Familiar na Medicina Integrativa

A Constelação familiar em sua ação psicoterapêutica é integrada à MI como uma TNC, que realiza uma interface com os tratamentos convencionais. Esta utiliza diversas técnicas ligadas à terapia breve, ao psicodrama e à análise de padrões fenomenológicos relacionados às questões familiares.

A MI ratifica em seus conceitos que não existe terapia inócua ao paciente, que a aplicação de qualquer técnica convencional associada às demais terapias deve possuir um diagnóstico nosológico médico e, no caso da Constelação Familiar, uma avaliação psicológica para a aplicação da mesma.

A SBMI entende a necessidade de formação técnica profissional para o discernimento da indicação, aplicação, encaminhamento e evolução clínica, na utilização das técnicas e praticas no modelo integrativo, resguardando assim possíveis agravos clínicos e os riscos físicos e psíquicos do uso inadequado das terapias.

Integração Médica com a Constelação Familiar

As ciências psíquicas em toda linha do tempo buscaram compreender as relações interpessoais que envolvem os núcleos familiares, utilizando instrumentos das mais diversas áreas do conhecimento, de técnicas de psicoterapia familiar e de ferramentas da fenomenologia na intenção de melhor assistir esse complexo drama existencial (Orengo et al., 2020).

O psicoterapeuta alemão Bert Hellinger, na década de 80, estudando e observando o comportamento e as atitudes de tribos africanas na resolução de conflitos, elaborou de forma sistematizada um conjunto de técnicas psicoterapêuticas que denominou de Constelação Familiar (Marino, Macedo, 2018; Cohen, 2006).

Além do inconsciente individual e do inconsciente coletivo, segundo Hellinger, existe a influência de um inconsciente familiar sobre cada membro de uma família (Marino, Macedo, 2018). Com foco a solução de conflitos, o objetivo é facilitar o entendimento de transtornos psicológicos, especialmente aqueles que podem estar sendo estimulados pela dinâmica das relações familiares ou de relacionamentos, através da identificação de fatores de estresse. Assim, o paciente é capacitado a observar o mundo de diferentes perspectivas (Marino, Macedo, 2018).

Segundo Hellinger, as ações realizadas em consonância com essas leis favorecem que a vida flua de modo equilibrado e harmônico; quando transgredidas, ocasionam perda da saúde, da vitalidade, da realização, dos bons relacionamentos, com decorrente fracasso nos objetivos de vida (Marino, Macedo, 2018). Ele propôs que, se as ordens básicas da vida forem conhecidas e compreendidas, podem ser integradas conscientemente na rotina diária e o paciente, ao agir de acordo com elas, a visão e o comportamento poderiam ser transformados em algo positivo, permitindo viver uma vida mais fácil e feliz” (Del Monte, 2021).

Com o auxílio das abordagens da Dinâmica de grupo, das artes plásticas de Virginia Satir, da Terapia Primária, da Análise Transacional e dos métodos hipnoterapêuticos, Hellinger desenvolveu sua própria Terapia Sistêmica e Familiar (Lopes, Costa, 2018). A finalidade é investigar as inter-relações familiares nos seus mais diversos períodos existenciais, na intenção de identificar os bloqueios na saúde emocional, permitindo uma amplitude na assistência terapêutica (Portaria nº 702 de 21 de março de 2018).

A constelação familiar é uma abordagem capaz de mostrar com simplicidade, profundidade e praticidade onde está a raiz, a origem, de um distúrbio de relacionamento, psicológico, psiquiátrico, financeiro e físico, levando o indivíduo a um outro nível de consciência em relação ao problema e mostrando uma solução prática e amorosa de pertencimento, respeito e equilíbrio. É indicada para todas as idades, classes sociais, e sem qualquer vínculo ou abordagem religiosa, podendo ser indicada para qualquer pessoa doente, em qualquer nível e qualquer idade (Portaria nº 702 de 21 de março de 2018). A técnica não substitui tratamentos médicos e psicológicos, mas fundamenta um modelo integral de tratamento, sendo uma terapia complementar que traz à tona questões que antes não eram percebidas nem mesmo pelo próprio paciente (Resende et al., 2020).

O paciente é capaz de perceber tanto uma conexão prerreflectiva e sistêmica entre o campo ancestral e a questão de apresentação quanto um possível movimento de cura de traumas transgeracionais. Uma vez que esse insight aparece, o processo é levado a uma conclusão suave, com integração da cura ao longo do tempo. A técnica é recurso adicional a tratamento psicoterapêutico (Cohen, 2006). A terapia também se aplica a outras esferas conflitivas, como trabalho, comunidade, perpetrador-vítima, por exemplo (Thege et al., 2021).

Na Constelação Familiar, ocorrem abordagens normalmente administradas em um ambiente de grupo no qual aproximadamente 15-25 participantes não relacionados, que se reúnem para um seminário/workshop de 2-3 dias, orientado por facilitadores. Cada constelação começa com uma breve entrevista entre o facilitador e o paciente para esclarecer o objetivo do indivíduo com a intervenção. A seguir, é decidido de forma conjunta quais membros do sistema do paciente desempenham um papel importante na questão apresentada e estes são representados por outros membros do grupo durante a constelação (Thege et al., 2021). Os representantes (incluindo o representante do paciente) são posicionados na sala pelo paciente, inicialmente, com distâncias espaciais, ângulos e posturas corporais destinadas a corresponder à imagem interna do sistema (“constelação de problemas”). Isso permite que o facilitador identifique a dinâmica abaixo da preocupação de apresentação do paciente, ao mesmo tempo em que o ajuda a refletir sobre sua experiência interna do ponto de vista mais objetivo e parcialmente externo (como são observadores e não participantes neste momento). Essa parte do processo não é verbal, com foco no que os participantes começam a experimentar como parte da estrutura criada pelo paciente em análise. Em seguida, os representantes são questionados pelo terapeuta sobre suas sensações físicas, sentimentos e pensamentos que tiveram enquanto estavam em suas posições. Rearranjos, ajustes espaciais e conversas breves e ritualizadas são feitas com base nos princípios do funcionamento saudável dentro de um sistema até que uma constelação é identificada para oferecer uma resolução para o problema apresentado pelo paciente (Thege et al., 2021).

A despeito do aumento da aplicabilidade por terapeutas de diversas origens teóricas e profissionais, poucos estudos foram conduzidos sobre a eficácia da intervenção (Thege et al., 2021). As evidências apresentam variabilidade de resposta em função do tipo de intervenção e grupo estudado, limitando uma avaliação mais abrangente (Thege et al., 2021).

A terapia de Constelação Familiar tornou-se particularmente popular na Europa e na América do Sul (tornando-se parte do sistema público de saúde em certos países) e está se expandindo rapidamente na América do Norte e Ásia. A associação profissional alemã ‘Deutsche Gesellschaft für Systemaufstellungen’ apresenta mais de 450 profissionais registrados (Thege et al., 2021).

A International Systemic Constellations Association (ISCA) é uma entidade internacional conhecida pela divulgação da técnica, sendo fonte de informação e padronização da técnica.

Escolas de formação geralmente oferecem cursos de dois anos. Pode-se destacar a Hellinger Sciencia – Hellinger Schule, que pertence ao próprio Bert Hellinger e esposa, a escola The Centre for Systemic Constellation, no Reino Unido e no México, Constelaciones México Instituto de Soluciones Sistémicas.

A Constelação Familiar tem hoje no país uma intensa repercussão nos contextos terapêuticos privados, instituições/organizações, e mais recentemente na saúde pública no Brasil (SUS) pela Portaria nº 702 de 21 de março de 2018 do Ministério da Saúde na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares – PNPIC e no sistema judiciário pela Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, como técnica para promover acordos judiciais (Marino, Macedo, 2018; Lopes, Costa, 2018).

No Brasil, a Associação Brasileira dos Consteladores Sistêmicos (ABC) representa a técnica, reunindo profissionais de diversas áreas que participaram do treinamento, formação e graduação em Constelações Sistêmicas e que trabalham com este método.

Desde 2006, o Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (UFG), vinculado à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) realiza, mensalmente, o Grupo de Constelações Familiares. O serviço é oferecido gratuitamente à população, sob responsabilidade dos pelos médicos José Miguel e Vânia Meira (Resende et al., 2020).

Na Universidade Federal de Pernambuco, o Projeto ‘Fluir com a vida’ mantido pelo Espaço de Diálogo e Reparação da UFPE (EDR), é desenvolvido o projeto de Constelações familiares e sistêmicas, para atendimento a questões existenciais com fundo familiar e relações interpessoais e desvelamentos de cuidados de conflitos. O serviço é conduzido pelo do Dr. Thiago Ribeiro de Souza, Psicólogo, que também é responsável pelo serviço de Constelação Familiar no Serviço Integrado de Saúde (SIS) – Prefeitura do Recife/UFPE. O SIS é um serviço público de saúde, implantado em 2013, que funciona como Unidade de Referência em Práticas Integrativas e Complementares, como Programa de Extensão da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e como Núcleo Comunitário de Cultura, Comunicação e Saúde, uma parceria entre UFPE e a Secretaria Municipal de Saúde do Recife. O município do Recife, capital do estado de Pernambuco, foi um dos pioneiros na implantação das PICS na rede de saúde, a partir da criação de Unidades de Cuidados Integrais (UCIS) (Sousa, Guimarães, Gallego-Perez, 2021).

Na UNIFESP, o NUMEPI (Núcleo de Medicina e Práticas Integrativas), a constelação familiar é oferecida gratuitamente no Ambulatório de Cuidados Integrativos e é um dos temas a serem desenvolvidos na prática do módulo de psicologia. Atualmente, o NUMEPI é coordenado pela doutora em Ciências/Neurologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Sissy Veloso Fontes, também coordenadora e fundadora do Núcleo de Cuidados Integrativos do Departamento de Neurologia e Neurocirurgia da UNIFESP, tendo orientado trabalho científico sobre Constelação Familiar Sistêmica.

Em 2019, foi iniciado um projeto na unidade do posto de saúde do bairro Ipiranga em São José, na Grande Florianópolis através da oficina “Conversas de Saúde”. A iniciativa teve por objetivo iniciar um trabalho de constelação familiar, apoiado pelo Instituto Ipê Roxo, que é especializado nesta terapia. O trabalho gratuito foi iniciativa da médica Vivian Da Cas Engelke, que atende ao posto, com condução da professora e consteladora Gabriela Felippe, do Instituto Ipê Roxo (Ipê Roxo, 2019).

Referências:

  • Cohen DB. “Family Constellations”: An Innovative Systemic Phenomenological Group Process From Germany. The Family Journal 14(3): 226–233, 2006.
  • Del Monte C. Family Constellations: A controversial and bold ‘development’ in therapeutic practices. Disponível em: https://www.dailymaverick.co.za/article/2021-05-11-family-constellations-a-controversial-and-bold-development-in-therapeutic-practices/. Acesso em: 06 nov 2021.
  • Ipê Roxo, Saúde Sistêmica: projeto pioneiro com Constelação Familiar no SUS com a participação do Instituto Ipê Roxo, 2019. Disponível em: https://iperoxo.com/2019/01/30/constelacao-familiar-no-sus-saude-sistemica/. Acesso em: 01 mai 2022.
  • Lopes MLP, Costa, VM. Constelação Sistêmica Familiar voltada ao poder judiciário na técnica de mediação judicial dos processos de família.  Revista Eletrônica do Curso de Direito da UFSM 13(3): 1190-1204, 2018.
  • Marino S, Macedo RMS. A Constelação Familiar é sistêmica? Nova perspect. sist. 27(62): 24-33, 2018.
  • Orengo, FV, Holanda AFG, Akira T. Fenomenologia e Psicologia Fenomelógica para psicólogos brasileiros: uma compreensão empírica. Psicologia em Estudo 25: e45065, 2020.
  • Portaria nº 702 de 21 de março de 2018.  Altera a Portaria de Consolidação nº 2/GM/MS, de 28 de setembro de 2017, para incluir novas práticas na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares-PNPIC. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2018.
  • Resende QM, Alves ATC, Marinho AP, Jacinto DT, Rodrigues DLM, Morais LR,
  • Resolução nº 125, de 29 de Novembro de 2010. Dispõe sobre a Política Pública de tratamento adequado dos conflitos de interesses. Brasília, DF: Conselho Nacional de Justiça, 2010.
  • Sousa IC, Guimarães MB, Gallego-Perez DF. Experiências e reflexões sobre medicinas tradicionais, complementares e integrativas em sistemas de saúde nas Américas. Recife: Fiocruz-PE; ObservaPICS, 2021. Disponível em: https://docs.bvsalud.org/biblioref/2021/03/1151530/mtci-america-observapics-rede-mtci.pdf. Acesso em: 01 mai 2022.
  • Sousa MJ, Pereira ML, Nunes MR, de Oliveira ME. Constelação familiar sistêmica segundo Bert Hellinger na atenção primária. In: Dal Molin RS. Saúde Em Foco: Temas Contemporâneos – Volume 3. São Paulo: Editora Científica Digital, 2020. Disponível em: https://downloads.editoracientifica.org/articles/201001697.pdf. Acesso em: 30 abr 2022.
  • Thege KB, Petroll C, Rivas C, Scholtens S. The Effectiveness of Family Constellation Therapy in Improving Mental Health: A Systematic Review. Family Process 60(2): 409-423, 2021.