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Bioenergética

A Medicina Integrativa (MI) classifica a Análise Bioenergética como uma Técnica Não Convencional (TNC), visto ser uma técnica descendente da “vegetoterapia”, técnica terapêutica-corporal criada por Wilhelm Reich atribuída de novas dinâmicas em sua prática. John Pierrakose Alexander Lowen desenvolveram esse novo modelo de análise psicoterapêutica, envolvendo múltiplos aspectos biopsicossociais por meio de trabalhos corporais.

A Inserção da Bioenergética na Medicina Integrativa

A Análise Bioenergética em sua ação psicoterapêutica é integrada a MI com uma TNC, que realiza a interface com os tratamentos convencionais nos quadros associados às características biopsicossociais. A MI ratifica em seus conceitos que não existe terapia inócua ao paciente, que a aplicação de qualquer técnica convencional associada a outras, deve inicialmente possuir um diagnóstico nosológico médico e, no caso da Bioenergética, uma avaliação diagnóstica da psicologia para a aplicação da mesma.

Com isso, a Sociedade Brasileira de Medicina Integrativa (SBMI) entende que a integração das TNCs, no modelo integrativo, necessita de formação técnica, habilitando o profissional de saúde com o conhecimento adequado e o discernimento para a indicação, aplicação, encaminhamento e evolução clínica. Resguardando, assim possíveis agravos clínicos e os riscos físicos e psíquicos do uso inadequado das terapias.

Integração Médica com a Bioenergética

A Bioenergética é uma forma específica de psicoterapia corporal baseada na continuidade entre corpo e mente, enraizada no trabalho de Wilhelm Reich e fundada por Alexander Lowen (Gomes, 2016). Compreende uma análise que amplifica a teoria do funcionamento da mente elaborada em suas bases pelo médico austríaco Dr. Sigmund Freud, e a terapia corporal do psiquiatra Dr. Wilhelm Reich. Além da discrição pragmática da mente, são ressaltados aspectos peculiares do funcionamento somático no campo terapêutico (Xavier, da Silva, 2015).

Dr. Reich, psicanalista e discípulo de Freud, pesquisou sobre a identidade funcional entre o corpo e a mente, assim, ele estudou as atitudes do corpo em seus pacientes para acessar o inconsciente. A partir desta visão, Alexander Lowen junto com John Pierrakos criaram a Análise Bioenergética, uma nova forma de ver a personalidade a partir do contexto corporal. Segundo Lowen, a Análise Bioenergética é o estudo dos processos energéticos do corpo inseridos na personalidade humana, influenciando diretamente os processos vitais do ser humano: sentimentos, movimentos e pensamentos. A quantidade de energia que um indivíduo possui e utiliza determina sua personalidade, que é influenciada pela dinâmica e a história familiar do indivíduo (Weigand, 2005; Correia, 2014).

Na condução desta técnica não convencional utilizam-se recursos como a respiração, a vibração, o enraizamento (grounding), a tensão muscular, a voz e a auto-expressão do indivíduo com a intenção de desvenciliar as couraças musculares e seus segmentos (Rodrigues, Pacheco, 2018). A Bioenergética é uma importante ferramenta no processo terapêutico, na busca do entendimento da expressão corporal natural, na expressão dos sentimentos e na compreensão dos significados da personalidade, associados a expressões corporais naturais (Weigand, 2005; Rodrigues, Pacheco, 2018).

O International Institute for Bioenergetic Analysis (IIBA) e a European Federation for Bioenergetic Analysis-Psychotherapy são instituições internacionais que difundem a técnica. O IIBA promove a difusão internacional da produção técnica e científica com a publicação “The Clinical Journal of the International Institute for Bioenergetics Analysis” que é publicado desde 1985. Atualmente, existem instituições de Análise Bioenergética filiadas ao IIBA em todos os continentes.

A Sociedade Brasileira de Análise Bioenergética (SOBAB) foi fundada em 1981 pelas psicólogas Miriam de Campos e Odila Weigand e tornou-se um centro de referência importante desta técnica no país, sendo a primeira do país filiada ao IIBA (Barreto et al., 2020). A SOBAB disponibiliza um curso de formação de 4 anos, com título certificado pelo IIBA.

O psiquiatra Dr. José Ângelo Gaiarsa, especialista em técnicas corporais em psicoterapia, foi um dos grandes responsáveis no aprimoramento científico da análise não verbal e da compreensão do corpo e sua subjetividade e que introduziu o pensamento do psicanalista Wilhelm Reich no país.

Oficialmente, a Bioenergética começou a fazer parte da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) em 2018, mas as experiências envolvendo a Análise Bioenergética no SUS iniciaram-se há mais tempo, conduzidas por profissionais de saúde com formação de analistas bioenergéticos e através de parcerias com os institutos de formação (Ministério da Saúde, 2018). Existem centros que oferecem a Terapia Bioenergética espalhados pelo país. Em Recife, a partir do trabalho pioneiro das psicólogas Margarida Laranjeira e Graça Serrano e da médica psiquiatra Auxiliadora Falcão o serviço é oferecido na Unidade de Cuidados Integrais à Saúde (UCIS) desde 2004.

Há grupos que aplicam a Bioenergética no acompanhamento de pacientes nas redes de atenção psicossocial, em serviços de média e alta complexidade, bem como no trabalho de humanização e educação permanente dos profissionais do SUS; no cuidado em saúde mental; no tratamento de transtornos psicossomáticos; no cuidado destinado a portadores de doenças crônicas não transmissíveis e autoimunes; em ações de cuidado com grupos específicos (idosos, gestantes, por exemplo). Essas iniciativas encontram-se disseminadas em outras localidades como as dos estados de Pernambuco, Bahia, São Paulo, Espírito Santo e Piauí (Ministério da Saúde, 2018).

Embora estudos clínicos de maior peso não terem sido realizados com a Bioenergética, podem ser encontrados inúmeros relatos em formato de monografias e publicações em eventos de área de saúde que descrevem experiências exitosas com a metodologia, com benefícios alcançados em diversas áreas (Ministério da Saúde, 2018).  A maior parte dos trabalhos publicados são revisões bibliográficas ou estudos clínicos, com produções que apresentam discussões voltadas para atuação clínica de psicoterapeutas, assim como aspectos de avaliações das práticas profissionais, avaliação de técnicas empregadas em intervenção e/ou no manejo dos processos psicoterápicos (Barreto et al., 2020).

A neuropsicóloga Roselene Espírito Santo Wagner tem trabalhado com a Bioenergética por muitos anos, sendo uma defensora da técnica. A utilização dos padrões de postura e atitudes corporais, que expressam a experiência individual em nível físico por meio da qual se pode mostrar como a dinâmica da estrutura corporal revela a mesma estrutura de caráter (Monteiro, 2020). A observação da expressão e forma física é mais uma maneira de revelar o inconsciente, sendo utilizada no consultório promoção de saúde tanto psíquica quanto emocional (Monteiro, 2020).

Por ajudar os pacientes expressarem experiências traumáticas e dolorosas e conflitos emocionais, a Bioenergética como ação psicoterapêutica pode auxiliar pessoas enlutadas a passarem pelo processo de luto e superar a dor e a perda. (Pandolfi, 2018). Em 2018, Pandolfi acompanhou pacientes durante o luto em sua tese de Doutorado, utilizando uma abordagem à luz da Teoria do Apego de Bowlby e da Análise Bioenergética. Dentro das ações propostas, foram observadas melhoras estatisticamente significativas em relação ao desespero, pânico, crescimento pessoal, culpa e raiva, desapego e desorganização, indicando que a intervenção utilizada favoreceu os participantes em seus processos de luto.

Outro campo de aplicabilidade clínica é a utilização da Bioenergética em técnicas de atividades corporais com objetivos terapêuticos, visando melhora de postura, percepção de limites e de espaço para melhora da qualidade de vida. Em grupo de terceira idade estudado por Weigand em 2005, a aplicação da bioenergética e técnicas de Grounding se mostraram significativas para ganho de qualidade de vida, em que o potencial curativo da técnica foi visível, tendo revelado até questões individuais com necessidade de tratamento psicoterapêutico.

A Bioenergética, além de ferramenta psicoterapêutica, também vem sendo utilizada no estudo das relações e expressões humanas e da linguagem corporal. Um exemplo é o trabalho de Hermida que em 2012 realizou uma pesquisa para utilização em processo criativo grupal a introdução de exercícios e teorias certos princípios da Psicologia Bioenergética para o desenvolvimento da criatividade na arte do palhaço. A partir do estudo da Psicoterapia Bioenergética de Alexander Lowen, adotando principalmente o legado téorico e prático deixado por Jacques Lecoq (2003), para compor um caminho artístico que, em conjunção com exercícios bioenergéticos, tem a capacidade de provocar ampliações de consciência e flexibilizações psíquico-corporais positivas na vida cotidiana e no desenvolvimento artístico dos seus praticantes. Nesta proposta de treinamento de palhaço, se tentou flexibilizar a rigidez da estrutura psíquica-corporal, chamada de “couraça” por Reich, e com isso provocar um movimento externo, que, através da identificação e do riso do público, mexe com a dureza da estrutura social estabelecida (Hermida, 2012).

No que tange à Bioenergética e psicoterapia, estudos que consideram uma abordagem voltada à neurociência se apresentam como perspectiva para comprovação de efeitos em um nível bioquímico (Klopstech, 2015).

Referências:

  • Barreto AF, Santos G, Silva JF. Análise Bioenergética: uma Revisão Integrativa das metodologias utilizadas no campo nos últimos 10 anos. Revista Latino-Americana de Psicologia Corporal 9:77-99, 2020.
  • Correia GWB.  Análise Bioenergética para além das quatro paredes.  Revista Latino-Americana de Psicologia Corporal 1(1): 28-43, 2014.
  • Gomes MJB. Terapia bioenergética: Saúde física E psíquica. Arch Health Invest 2016, 5.
  • Hermida, SVH. Palhaçaria e psicologia bioenergética no contexto das artes cênicas’ 01/03/2012 174 f. Mestrado em Artes Cênicas, Instituição de ensino: Universidade Federal da Bahia, Salvador. Biblioteca Depositária: Biblioteca Nelson Araújo-Escola de Teatro.
  • Klopstech A. Catharsis and self-regulation revisited: scientific and clinical considerations. Bioenergetic Analysis 15:101-133, 2015.
  • Ministério da Saúde. Bioenergética – Conhecendo as Práticas Integrativas e Complementares em Saúde, 2018. Disponível em: < https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/praticas_integrativas_saude_bioenergetica_1ed.pdf>. Acesso em: 05 nov 2021.
  • Monteiro L. Formato e expressões do corpo dizem muito sobre o caráter do ser humano. 2020. Disponível em: <https://www.em.com.br/app/noticia/bem-viver/2020/09/26/interna_bem_viver,1123077/formato-e-expressoes-do-corpo-dizem-muito-sobre-o-carater-do-ser-human.shtml>. Acesso em: 24 abr 2022.
  • Pandolfi A. Análise bioenergética: um recurso psicoterapêutico no processo de luto. 2018. 143 f. Tese (Doutorado em Psicologia: Psicologia Clínica) – Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia: Psicologia Clínica, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2018.
  • Rodrigues, MPC, Pacheco SCC. A análise bioenergética como ferramenta de bem-estar num grupo de mulheres idosas. Investigación en Enfermería: Imagen y Desarrollo, 20(2): 1-12, 2018.
  • Weigand OQB. Grounding in Bioenergetic Analysis. An update. 2005. 155 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2005.
  • Weigand OQB. Grounding na análise bioenergética. Uma proposta de atualização. Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2005, 155 p.
  • Xavier RG, da Silva RCA.  Desafios das práticas clínicas psicocorporais na contemporaneidade: um relato de experiência.  Revista Latino-americana de Psicologia Corporal 2(4): 76-90, 2015.